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DIVINO CHICO


Ele não é artista bom. E desde que vá se tornando verdadeiramente artista, é por que concomitantemente está se tornando artesão”.


Assim começamos a falar de José Francisco Costa um artista /artesão que confirma com seu trabalho ser o artesanato pertencente a um mundo anterior à separação entre o útil e o belo. Seu nome artístico, “Chico Divino”, ao contrário do que se diz por aí , foi forjado por ele mesmo, para seu curso de teatro ,no final dos anos 80, para o qual se inscreveu “para se aperfeiçoar” .


Desde jovem participava das encenações religiosas como Paixão de Cristo, descendimento da Cruz, procissão do Fogaréu, Autos de Natal , casamentos caipiras das quadrilhas… Confeccionava artesanalmente suas próprias roupas e de seus companheiros,trajes de centuriões e soldados romanos, adereços como lanças, capacetes, “Armas Christie”.


Dessa rica tradição religiosa presente em Paraty na Semana Santa e nas Festas, provém seu principal trabalho artesanal: as pombinhas do Divino, presentes em todas as bandeiras que os fiéis carregam durante a novena em honra ao Espírito Santo durante a Festa do Divino . Festa que devido suas fortes raízes , tradição e complexidade , tornou-se Patrimônio Imaterial brasileiro em 2013.


O menino Francisco José, por influência do avô e do pai, se interessou pela madeira, pela carpintaria. Fazia seus próprios brinquedos, aviõezinhos, caminhões, bilboquês, miniaturas de móveis. Essa habilidade foi notada pelo festeiro do Divino do ano de 1981, Hilton Silva, que pediu ao menino de 11 anos que restaurasse algumas antigas pombinhas das bandeiras de promessa .


Segundo Chico Divino, eram “mais rústicas e toscas” , mas com o passar dos anos ele foi aperfeiçoando, sem no entanto perder sua identidade e originalidade.Passou a fazer resplendores do Divino, oferecendo aos devotos do Centro Histórico, os primeiros com o intuito de comprar um novo trompete, instrumento que desde os 15 anos toca na Banda Santa Cecília. Aos 10 anos iniciou tocando prato, foi aluno do Maestro Potinho e depois de 5 anos o trompete passou a fazer parte de sua vida, participando com a Banda das festividades cívicas, religiosas e do Carnaval de Paraty.


Outra marca registrada do seu trabalho são as miniaturas e foi num levantamento do mastro do Divino que lhe veio a inspiração para fazer uma miniatura dele, assim como de mastros de outras festas de Paraty.


Além de artesão, escultor, Chico Divino é restaurador. Foi aprendendo a profissão na prática, seu primeiro trabalho foi o altar da Capela da Generozza. Depois disso foi convidado a restaurar o altar da Matriz.Durante dois anos trocou conhecimento com uma restauradora do Rio de Janeiro fez a reforma da Igreja do Rosário, da Matriz de nossa senhora do Carmo de Angra, entre tantas outras . Montou com seu irmão uma firma de restauração, a “ Rosarium” ,atualmente encarregada do restauro da Igreja da Vila Histórica de Mambucaba , Angra dos Reis.


A herança que recebemos de gerações passadas, podem não dar frutos no presente, mas, se atribuirmos sentido ao que foi herdado,ela perpetua e permanece. Assim é o caso de Chico Divino, que desde criança se tornou um guardião do patrimônio, do “saber fazer” pombinhas esculpidas do Divino, resplendores, brinquedos…O que herdou de seus antepassados e da sua comunidade é reprocessado,ganha novos sentidos,resgata conhecimentos acumulados há gerações, mostra a importância que devemos dar ao legado que nos é deixado e a relevância de passá-las às futuras gerações .


A pombinha do Divino, esculpida uma a uma, com ferramentas próprias, (muitas criadas por ele), com o característico mundo a seus pés,é um exemplo de objeto cultural, que a comunidade, instintivamente , elege como digna de ser preservada e valorizada. É um código simbólico e, como tal, possibilita múltiplas reflexões sobre a identidade do povo e do homem que a produz, usa e perpetua. É uma arte/artesanato de tradição, um produto singular de Paraty.Em qualquer lugar do mundo que vá , levará a marca de Paraty, da bela Festa do Divino e do seu artesão maior: Chico Divino.

 

Curadoria: Patrícia Gibrail

Produção: Emanuel Gama

Design: Leonardo Assis

Texto: Flora Salles


Abertura: 10 de maio de 2018

Encerramento: 1 de julho de 2018

Natalino Silva


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